Transições
Via costeira,praia de Ponta Negra, Natal RN(Foto: Iatamyra Rocha)
Como uma maçã cortada
Vejo rubores e depressões âmbar
No olhar a vejo alada
Infinita na cadência de um samba
E me escapa um fio branco
Entre o erre e o erro
Estanco
-- Todo o vermelho e verde da fruta
Escrevo teu gosto
Ciente da minha língua e do meu tempo
Que me ausculta
Ouço o rio borbulhar
Nas suas pequenas e grandes palpitações
Doce igual à fruta do meu lar
Sem grandes complicações
[--Minha maçã preferida é verde (pauso e digo)
Lembro-me do suco de uva na casa da maçã
Preferindo ao leite (explico)
Enquanto ouço papos de Vietnã
- Filosofando só pra mim meio vã]
Meu ponto de partida me ecoa
Esvai minha carranca naquela proa
Há na vida um estalo contido
Meio ralo, solto, num elo perdido
E me abandono muitas vezes nesse
feixe
Meio raio, feito barco, semipeixe
Na árvore da minha terra
Não se espreme o fruto
Nem se enrola em torno de si
- O suco
A essência é contida no ato de se
conter
Sem grandes contentamentos de ser
-- um pássaro a bicar do alto
Em pequenos prazeres
Entre o balanço das asas
E os versos a me dizeres
Penso que falar de mim
Solta as folhas, sem que me vejas
no verso
Então nessa poesia, regresso
Sem meias frases antigas
Ou cantigas contidas
A vírgula é a pausa na língua
E a costela uma haste
-Do peito
Vejo e sinto teu coração
Nessa imperfeição
Que de tão perfeito
Faz de mim essa canção
Há momentos
Que o silêncio
Habita o soprar das folhas
Arrepia as asas
E arrebenta as bolhas
E nesse momento
O estalo se ouve
O cadarço amarra
E o corte lembra o açoite
-Dos porões levemente escuros
No canto dos cordões
Mais puros
E lá te lembro
Feito casca vou me arrancando e
saindo
Não sei se nessa substância dura e
branca
Ou se apenas numa frágil lembrança
Do que me lembro
No que fui, e no que ainda nem sei
se sou
No acaso de me encontrar saindo e
me compondo
Apenas me vou
Sendo só um Picasso
Ou um grafite de um muro na
paisagem
Piso o chão e vejo todo risco da
aragem
Ficar pequeno
É ver nas dobras o liso das
cicatrizes
Um livro aberto
De velhas matizes
Assim recomponho
Grandes navegações
Novas pautas
Soltas paixões
Dentro da linha
Há a firmeza do diâmetro a medir
E a possibilidade do movimento
Que poderá vir
Abrindo na geometria
Aspectos
(E ao redor dela)
Que a muito já surgia
Uma aquarela
Que antes já Luzia
Escrevo aqui algumas maçãs
Na firmeza da minha mordida
E na certeza
Que o que falam da ilusão
Já é coisa iludida
Vejo na exatidão
Da minha verdade
De tudo um pouco
Da fome e do que resta dessa
saudade
E do que ainda não medi
Na igualdade da fraternidade
Verso do meu coração
Umas maçãs verdes
Pois dessa eu sei bem o gosto
A respeito da sede
Meu copo é pequeno mais composto
Transborda de certezas
Que só as do ouro
No silêncio das línguas ancestrais
Trouxeram a Foro.
- Iatamyra Rocha
"As mãos de Clarisse
Causam-me tantos martírios
As tuas mãos adoradas,
Com estes dedos de fadas,
Tão formosos e pequenos...
Que eu chamaria de lírios,
Se houvesse lírios morenos!
- Auta de Souza (livro HORTO)"
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